quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Ela

Ela é temida, bem vinda, abençoada, ritmada, inexplicável. As vezes, bem antes da sua chegada por um longo tempo, ela vai e vem em visitas esporádicas. Faz faltar o ar, desconcentrar do mundo e focar no umbigo. O rosto se fecha, o corpo busca uma forma de acolhê-la de uma maneira menos dolorosa. Ela vai como ondas.
Trabalho de Parto - Piraí-RJ
Quando ela chega, abraça as entranhas, reviras as verdades, faz revelar as sombras. Aflora o medo, em forma de tremor. O medo de nascer, porque quando ela chega, é para valer. Ela encaranfucha cantos obscuras da alma. Ela faz esvaziar o intestino , embrulha o estômago. Ela exaure cada célula pulsante.
E cada vez ela vem mais perto, porque a praia está ali. Uma estrada que termina no nascimento. Como explicar como ela é para quem nunca sentiu? Impossível. Ela é a comunicação das entranhas, o abraço completo, apertado à vida. Ela se ritma no compasso dos hormônios orquestrados pela mulher e o ambiente.
Tem quem se opere para não senti-la. Aposto que existe um monte de médico que nunca presenciou uma seqüência delas. Essa constancia que faz a mulher despir-se das roupas, das amarras. Tem quem tente não gritar quando ela chega. Tem quem consiga por um tempo. Mas sua chegada intensa e derradeira, não há quem não grite. Ela é um gemido, um misto de prazer e dor. Ela vale a pena porque é o impulso mais profundo de vida.
Tem horas que a gente queria que ela simplesmente sumisse, assim como apareceu. E as vezes isso acontece depois de uma anestesia. Mas o efeito é o fim da linha antes do fim da estrada. Ela é bem vinda. Quando mais intensa e arrebatadora, melhor (desde que seja natural).
É por causa dela que nos abrimos com os pés na terra e a cabeça nos céus. Ela é o chamado da Terra para o centro. A chamam de contração, mas acredito que ela seja uma expansão. Nunca vi alguém que a recebeu até o fim da jornada sem se expandir, transformar e renascer.

Kalu Brum